ALERJ

Comissão do Cumpra-se da Alerj debate medidas para aprimorar reconhecimento fotográfico nas delegacias

A Comissão de Representação para Acompanhar o Cumprimento das Leis (Cumpra-se), da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), debateu em audiência pública na sexta-feira (18/08) medidas para formatar a versão final do Projeto de Lei 5272/2021, que visa a aperfeiçoar o reconhecimento fotográfico nas delegacias. O colegiado tem como objetivo incorporar ao projeto determinações previstas na Resolução 484/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabeleceu diretrizes para o procedimento de identificação.

De acordo com o presidente da Comissão e um dos autores do projeto, deputado Carlos Minc (PSB), as novas diretrizes a serem incluídas na proposta estabelecem a necessidade de se ter uma polícia mais investigativa para determinar uma prisão, saber onde o suspeito estava no momento do crime, qual o álibi dele e de que maneira foi feito o reconhecimento, entre outras medidas. “O Rio de Janeiro é o estado onde há mais prisões equivocadas. Depois de as pessoas serem soltas, quem é que vai reparar o sofrimento dela e da família? Por isso, buscamos aprimorar e aprovar o projeto”, disse.

Minc explicou, ainda, que a necessidade de atualização do texto do PL faz-se necessária porque a Resolução foi publicada cerca de um ano após a elaboração da proposta. “O projeto recebeu apoio da OAB, dos peritos da Polícia Civil e do diretor de ensino da Acadepol. Diante desse respaldo, o deputado Luiz Paulo [também autor do projeto de lei] e eu vamos à Comissão de Constituição e Justiça, da Casa, dialogar para que as boas sugestões que foram dadas nesta audiência sejam incorporadas no projeto com base na Resolução do CNJ, que impede a prisão apenas pelo reconhecimento fotográfico”, comentou.

Já Luiz Paulo (PSD) defende que a identificação, tanto presencial quanto fotográfica, seja tratada apenas como mais um indício para a investigação. “Esse tipo de reconhecimento é um indício para o processo investigativo e não um fato para determinar a prisão. O Projeto de Lei visa a trazer alguma regulamentação para esses procedimentos, a fim de que não se cometam mais injustiças. O ideal é que apenas a investigação completa leve à acusação. O avanço tecnológico está ampliando as possibilidades para isso”, afirmou.

CPI do Reconhecimento Fotográfico

Está em curso, na Alerj, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Reconhecimento Fotográfico nas Delegacias, que também tem como objetivo melhorar o sistema de identificação de suspeitos para diminuir a quantidade de prisões equivocadas. A presidente do colegiado, deputada Renata Souza (PSol), esteve presente na audiência pública e explicou como os temas discutidos poderão agregar elementos importantes ao trabalho da Comissão.

“O projeto apresentado pelos deputados Minc e Luiz Paulo contribui para que a gente possa afinar uma estratégia legislativa que garanta o reconhecimento da Resolução do CNJ. O que a gente tem, hoje, é que essas práticas são extremamente arbitrárias, como a produção de um álbum de suspeitos no qual não se sabe como aquelas fotos foram parar lá. Não se sabe de que maneira o profissional em questão pode induzir a vítima a achar uma pessoa em um álbum. A CPI ainda vai se aprofundar em termos gerais nesse tema”, pontuou.

Vítima de reconhecimento equivocado elogia iniciativas

O educador Danillo Félix foi preso duas vezes devido ao reconhecimento fotográfico equivocado. Ele se emocionou ao recordar dos 55 dias em que esteve privado de sua liberdade, passando por quatro unidades prisionais diferentes, onde afirma ter ficado em condições insalubres. O jovem elogiou a Alerj pelas iniciativas do Projeto de Lei e da implantação da CPI. “Eu me sinto muito representado porque se meu pai tivesse sofrido o que eu sofri, com a idade que tenho hoje, ele não teria todo esse suporte. Essas iniciativas são importantes para que outros jovens não tenham que passar pelo que eu passei”, frisou.

Pessoas negras são a maioria das vítimas

De acordo com relatório do CNJ, 83% dos casos de reconhecimento equivocado aconteceram com pessoas negras. Segundo a representante da Associação Advocacia Preta Carioca, Angela Borges Kimbangu, isto demonstra que o procedimento de reconhecimento fotográfico possui conotação racista. “Quando a gente fala de reconhecimento fotográfico, a gente fala de racismo. Após escravizarem nossos corpos, estamos discutindo, séculos depois, que estão buscando fotografias e com base nelas, prendendo nossa gente. O povo preto precisa de unidade, senão vamos continuar sofrendo”, enfatizou.

Já o integrante do projeto Educafro, Joelson Santiago, relatou que, mesmo tendo mais de 60 anos de idade, precisa andar pelas ruas portando a carteira de trabalho para, em abordagens policiais, provar que não é criminoso. “Senti na pele, no ano passado, depois de anos, o que é ser alvo de uma abordagem policial. Diziam que eu era foragido, enquanto eu tentava explicar ao policial que alguém que tem carteira assinada não pode ser foragido. O agente, de forma incisiva, dizia que eu poderia ter mudado o documento. Eu tinha menos de 14 anos quando fui abordado pela primeira vez e, depois de 50 anos, continuo sofrendo a mesma coisa”, ressaltou.

Também participaram da audiência pública o representante da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Álvaro Quintão; a coordenadora de Direitos Humanos e Minorias do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), Roberta Rosa Ribeiro; o diretor de ensino da Academia Estadual de Polícia Sylvio Terra (Acadepol), delegado Carlos Eduardo Rangel; a secretária municipal de Direitos Humanos da cidade de Niterói, Nadine Borges; a coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), Silvia Ramos; o presidente do Sindicato dos Peritos Oficiais do Estado do Rio de Janeiro (Sindperj), Filipe Guimarães Teixeira; e integrantes de entidades representativas do movimento negro.